“És a minha pessoa preferida”

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Written on quarta-feira, março 19, 2008 by Maria

O Conan O’Brien dizia no outro dia que um casal comemorava naquela semana, 83 anos de casados e que quando lhes perguntaram como se sentiam depois de tantos anos juntos, estes responderam “please kill us!” Passamos a vida à procura de uma pessoa que nos vai completar. E depois de a encontrarmos, não a suportamos. Todos os poetas escrevem sobre o amor, verdadeiro e eterno, hollywood e os seus realizadores passam a vida a inventar estórias novas para as suas comédias românticas. E chega-se mesmo a acreditar que o principal objectivo da nossa vida é encontrarmos “aquela” pessoa. Um desafio. Parece-me um jogo de pistas. Tem de ser alto e giro, e tem de ter piada, e saber falar e não ser burro. E quando encontramos uma pessoa assim, há sempre um problema. Ou já tem namorada, ou acabou um namoro longo há pouco tempo, ou ainda vive com os pais, ou vai viver para o estrangeiro não sei quantos anos, ou nós vamos para fora e ele não quer ir ou não pode e os namoros à distância não resultam. E na verdade, nunca chegamos a estar completos. Porque mesmo quando pensamos estar, mais tarde ou mais cedo, vai acabar. E quando acaba, a dor pesa nos olhos, e nas mãos, e nas costas e na barriga. O corpo dói mais do que quando está com gripe. A perda é pior que a morte, porque aquela pessoa que pensamos que nos completou, ainda está por cá, viva, mas só para os outros, para os outros. E há um dia atrás essa pessoa, era toda nossa, “és a minha pessoa preferida”. A verdade é que a dor passa e sem Brufen. O amor é efémero quer queiramos quer não. Se assim não fosse, não se faziam constantemente piadas sobre casamentos longos. Se assim não fosse, não ouvíamos coisas como “És a minha pessoa preferida” para meses depois nem nos falarmos. Se assim não fosse, nem sequer havia a psicanálise e a psicoterapia. Porque nos andamos sempre a curar da última dor, da última angústia. E vamos tomar cafés para contar aos amigos a nossa última desgraça. Que não passa de uma só coisa, um gajo que não conheciamos de lado nenhum, um dia apareceu e pareceu ser porreiro e falamos e demos os melhores beijos e jantamos e almoçamos e jantamos outra vez e fizemos amor, e durante meses ou anos ele estava em todas. E dormiamos juntos e que bom, acordavamos juntos. E agora acorda cada um em seu lado. E era um gajo que há algumas linhas acima nem conheciamos de parte alguma. E de repente este é o centro da nossa vida. “Nem imaginas o que a minha namorada me fez, foi passar o fim de semana com o João e disse-me que ía para casa da Patrícia, achas que me anda a traír?” Fodaaasss Chico, claro que sim. Mas deixa, agora parece que o mundo caíu, mas daqui a uns meses estás tu a fazer o mesmo a outra gaja, que não conhecias de lado nenhum, mas naquela noite estava no jantar de anos do Rui e chegaste a casa com o número dela e sentiste que te completava, e depois, já não. Porque numa noite mais tarde, conheceste a loira e ela fez-te uma conversa do caraças, e um homem não é de ferro e tal, e agora está aquela que te completou antes, no café com as amigas, a chamar-te cabrão que é o que tu és. Porque, procuramos tanto e por todo lado, desesperados para que essa parte da nossa vida aconteça e nos complete. Porque no trabalho e com os amigos e com a família está tudo optimo, excepto o divórcio dos meus tios e dos meus pais. “Ah mas a avó e o avô estão juntos e felizes há anos!” Felizes? Eles já não sabem quem são. Ela sabe que o avô liga o botão da tv e ali fica a Fátima Lopes toda a manhã com eles. Ele sabe que há 13h a sopa vai estar na mesa e que é ela que a põe. Dançam coordenados sem darem conta. Ele acaba a sopa, ela levanta a mesa, ele desliga a tv, ela vai fazer a lista do supermercado. Ele vai-se deitar, ela vai à missa. Ela volta, ele acordou, ela vai descansar um bocadinho para o quarto, ele vai ligar a tv. E mal se falam, porque falaram a vida toda e já não há nada para dizer. Já perderam a paciência um para o outro. Só a têm quando ao domingo vão os filhos e os netos lá a casa fazer barafunda e têm de parecer felizes. Quando toda a gente sai, entra o silêncio. E eles, os avós, pensam que são eles, os seus filhos e os seus netos, filhos dos filhos, as suas pessoas preferidas. Os filhos sim, talvez esses nos completem. “Filha, és a minha pessoa preferida”. Tão lógico, tão verdadeiro, tão dificil prever traição entre pai e filha, ou entre mãe e filho ou whatever. Se forem filhos do momento exacto em que o pai e mãe se completavam, aí sim, tudo parece fazer sentido, tudo parece perfeito. Mas nem sempre é assim. E quando não é assim, quando as coisas acontecem fora desse momento, desse exacto momento, temos um filho, que será na mesma e sem dúvida, a nossa pessoa preferida, mas imagino que até ao resto das nossas vidas, dentro do peito estamos a gritar, sem ninguém nos ouvir, “please kill us!” porque alguma coisa mesmo assim correu mal e estamos incompletos para sempre, porque é tarde de mais.


Piccola Maria

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16 Comments

  1. Caju |

    Meu Deus...!

    ADORO ter fundamento para dizer que as minhas amigas são MESMO MUITO BOAS!! AS MELHORES!! :)

    A busca incessante "daquela pessoa" termina quando esse silêncio passa a ser reconfortante. Porque não há palavras que digam o que tudo o resto quer dizer...

    Beijos, mi piccola! És grande!

     
  2. Caju |

    Ah... e tu és das minhas pessoas preferidas! :)

     
  3. Sara |

    ... Já te disse o que penso sobre o texto (pouco articulado, mas sentido!)

    De qualquer maneira babe, a verdade é que não há nada como ouvir de alguém "És a minha pessoa favorita"... ou dizer "És a minha pessoa favorita!"... Mesmo que o sentimento não seja eterno! ;)

     
  4. Anónimo |

    Nem sempre a nossa pessoa favorita é alguém do sexo oposto!
    Às vezes, com sorte é uma amiga, ou melhor, várias amigas.

    E se tivermos mesmo muuuita sorte, nem sequer temos de escolher! Ficamos com várias pessoas favoritas, um punhado de amigas daquelas boas mas mesmo boas, um mais-que-tudo barbudo, enfim...

    E todas estas pessoas são favoritas dependendo do dia e do que te apetece fazer.

    Aí sim vale a pena acordar, todos os dias, mesmo naqueles em que só pensas "please kill us!". Mesmo nesses, vale a pena.

     
  5. Anónimo |

    Estou sem palavras! É q tens mesmo razão no que dizes. E nesses casos é melhor nem adicionar nada.


    Só não posso deixar escapar isto:

    "Tem de ser alto e giro, e tem de ter piada, e saber falar e não ser burro."

    Tavas a pensar em mim? :)

     
  6. Anónimo |

    Amiga. O que escreveste - e muito bem escrito por sinal - transmite tudo o que de negro pode haver nas relações. Acho que por muito negras que as coisas possam ser (e eu que o diga), nunca vou perder a esperança que "um dia" vou ser feliz para o resto da vida.
    E sei que tu, embora a agora flagrante falta de fé, vais ser também.

    Vamos os dois ter essa esperança, sim? Estar apaixonado e feliz, nem que seja efémero, faz tudo quanto é merda valer a pena.

    Bjinhos gaija.

     
  7. Anónimo |

    A todos vocês que me têm dito, que estou descrente no amor. E ao comentario do anonimo (sei mt bem que és oh cromo!) deixem-me so explicar. Eu não estou, nem sou descrente. Eu acredito mesmo que o amor existe, só não acredito que exista para sempre. E por isso toda a gente sabe que eu não me quero casar, porque não acredito em casamentos happy ever after. E mais, porque a realidade é esta, a última coisa que devemos fazer, é que uma relação ou que uma pessoa em particular, se torne o centro da nossa vida. O centro de tudo devemos ser nós mesmos, egoisticamente e egocentricamente falando. Assim sim. tenho dito! :)

     
  8. Anónimo |

    Ok, anonimatos à parte - e desculpa continuar a bater no ceguinho - vou continuar a minha cruzada pelo amor eterno.

    Ele existe. E anda por aí. Lamentavelmente não é eterno para todos. É raro. Raro porque mesmo quando encontramos essa pessoa que nos completa, só por uma enxurrada de sorte o sentimento é recíproco. E mesmo quando isso bate certo, há outros obstáculos que podem minar a realização desse prodígio que é um amor eterno e correspondido.

    Mas no fim, é um bocado como o Freddy Krugger: só aparece a quem acredita nele. O amor só aparece a quem está disposto a arriscar nele e a torná-lo no centro da sua vida. E se, mesmo assim, a vida nos cagar em cima vezes sem conta, está na força de cada um de nós fazer disso adubo para um novo amor.

    Caso contrário andamos apenas aqui aos caídos, que nem toxicodependentes, à procura de mais uma dose que nos faça sentir melhor do que a anterior. Ou que apenas nos faça sentir menos vazios, nem que seja por breves instantes.

     
  9. Anónimo |

    Por favor piccola maria escreve mais, muito mais. Tenho de dizer, que para que acredites no amor eterno, só um burro não fica contigo eternamente, sem efemeridades. Quem se apaixona por ti, apaixona-se para sempre.

     
  10. Anónimo |

    É impressão minha ou há aqui uma declaração de amor do aquele para a piccola..

     
  11. Anónimo |

    ““Sou sonhadora por natureza”, diz a pesudo-actriz à pseudo-jornalista na revista cor-de-rosa. “Epá, aquele Pedro saiu-me cá um sonhador”, diz a Joana às amigas, em tom de crítica velada. Eu não sou sonhador por natureza, nem acredito em impossibilidades por defeito. Eu sonho. Fecho os olhos, e sonho. Muito. Todas as noites, horas a fio. Estes sonhos têm enredo, guião, diálogos, personagens mais ou menos concretas, mais ou menos reais, guarda-roupa, banda sonora, amor e ódio, visceralidade e dor. Quem não se recorda dos sonhos, inveja as minhas intrincadas novelas com travo a Hollywood e a vivacidade com que estas me ficam gravadas na retina, na pele. Eu invejo os sonhos nebulosos, difusos, neutros, dos outros. Invejo as noites brancas, não de insónias várias, mas de ausência de cor, de cheiros, de beijos, de corpos colados em noites longas, de beijos imensos e intensos e irrepetíveis em manhãs de preguiça, de partidas e chegadas. De partidas sem chegadas. De partidas.
    A verdade é que nem sempre sonho de noite. Há um sonho que me persegue nas horas acordadas. Sentado aqui, agora, sempre, sonho com o dia em que vou deixar de sonhar contigo.”

    Alguém escreveu, eu subscrevo, assino por baixo e partilho. Pode ser que ajude…

     
  12. Unknown |

    Minha querida Maria, será que vale a pena andarmos neste Mundo a correr de um lado para o outro se não for para encontrarmos alguém que nos complete?
    Na minha modesta opinião, não!
    É verdade que todos nós já pusemos em causa o amor eterno quando a "pessoa" que achámos que era "aquela pessoa" nos desiludiu e nos fez bater no fundo do poço. Mas é verdade também que a vida faz mais sentido quando tens alguém ao teu lado que se apaixona por ti com todas as tuas qualidades e defeitos e que te faz sentir especial, que é capaz de cuidar de ti quando estás doente, de te tapar os pés quando está frio e estás a dormir no sofá, etc etc...e não precisas de casar para ter tudo isso.
    Perfeito seria se todos nós encontrássemos alguém que nos preenchesse o espaço que falta nos nossos corações e nos acompanhasse até ao fim dos nossos dias, infelizmente nem toda a gente tem essa sorte, mas se não acreditarmos que isso nos possa acontecer, então vamos acreditar em quê?
    Eu, apesar dos meus trambolhões, continuo a acreditar!
    Relativamente a ti, espero sinceramente que encontres a tua "cara metade", porque se há pessoa que merece, és tu...
    E porque alguém disse e com razão, só um burro, tendo a oportunidade de ficar contigo eternamente, é que não a aproveita, porque se há alguém por quem é fácil nos apaixonarmos, é por ti...
    Beijinho grande

     
  13. Anónimo |

    O amor não acaba quando acaba. Há amores que acabam sem nunca terem começado. Amores que se esgotam, matemáticos, que subtraem, que são menos e menos e um dia acordas e descobres que, afinal, que também há amores em negativo. Há os amores a cores, a preto e branco, a vermelho sangue, de paixão, de ciúme, de raiva. E depois há o Amor. Que nos completa. Porque “és a minha pessoa preferida”, hoje e sempre, sem efemeridades nem burrices. Porque “quem se apaixona por ti apaixona-se para sempre”. Porque mesmo quando o amor parece que acaba, o Amor não acaba nunca.

     
  14. Anónimo |

    Já dizia um amigo meu:
    "O amor é um monte de estrume e eu sou o galo que canta lá de cima".

    ps: Hugo, com comentários desses não sacas nem uma "engenheira" do Técnico.

     
  15. Anónimo |

    XEIÇA PENEICO!!!

    Que este teu post transformou o Qual Roma numa tertúlia filosófica!

    E dizem coisa bonitas, dizem sim senhora.
    Mas sabes que mais..há pessoas que se tornam nossas favoritas por um pedaço de tempo, e chega por aí.

    Mais que isso não vale a pena...começa a cheirar mal!

     
  16. Anónimo |

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