Deve ser da corrente de ar.

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Written on segunda-feira, abril 04, 2011 by Maria


Andava eu a tirar o curso de publicidade, quando um dos meus professores, o que eu mais admirava, me desiludiu logo na primeira aula. Bastou-lhe dizer “Isto de ser copy é giro nos primeiros tempos, depois de 4 anos, já só queremos fazer outra coisa pelo mesmo salário”
Na altura pensei que só um gajo pouco apaixonado pela publicidade poderia pensar assim. Mesmo depois disto, este foi o meu professor preferido do curso.
Hoje, 4 anos depois. Sinto o mesmo que ele. Com uma enorme diferença, não quero o mesmo salário. Quero um muito melhor.
A publicidade é um mundo meio mágico quando se começa. Tudo parece ser possível. Temos exemplos de campanhas fabulosas e sabemos que um dia, vamos estar numa ficha técnica de uma campanha daquelas. Sonhamos tão alto.
Olho agora para o estagiário da minha agência. Ainda tem aquele brilhinho nos olhos. As ideias palpitam-se para o moleskine a toda a hora. O entusiasmo.
Se tenho saudades é desse entusiasmo.
Perdi-o. Não sei quando. Sei que levei muitas vezes trabalho para casa e resolvi-o com prazer. Ter ideias no sofá, na mesa a jantar, enquanto conduzia, era fácil. Agora, depois de ideias e mais ideias deitadas para lixo. Umas pelo nosso chefe, outras pelo clientes, outras pelo nosso dupla, outras por nós próprios. E depois de ideias e mais ideias estragadas, mudadas para pior, incompreendidas, massacradas por pessoas que não a tiveram mas que têm, porque podem, mexer nelas. Cansei-me.
Sinto que entupi. Entrei em piloto automático e os meus dias de cor e imaginação foram trocados por monotonia. Faço há 4 anos os mesmos anúncios de Natal, os mesmos anúncios de jornais, de centros comerciais, de bebidas, de carros. Os mesmos anúncios chatos e enfadonhos que ninguém lê. Que ninguém liga. Que ninguém quer ver a não ser as pessoas que os pagam. Ganho concursos a outras agencias e vejo toda a gente festejar de copo na mão e a única coisa que sinto é um sorrisinho a rasgar-me a cara, porque sei, tenho a certeza, que a campanha que ganhou o concurso, não vai sair para a rua, porque alguém vai impedir que tal aconteça, não sei quem, mas alguém vai.
E tudo bem, vem mais dinheiro para a agencia, só pode ser bom, pena que eu não seja a dona da agencia.
Para mim, fica tudo na mesma. Só mais um cliente chato, mais trabalho chumbado. E mais cansaço.
Ir gravar um spot de rádio, era uma emoção. Agora dá-me uma seca impossível.
Tudo no trabalho deixou de ser importante.
Importante para mim agora é chegar a casa. É fazer desporto. É andar na rua a ver coisas. É estar com amigos. Com as pessoas que importam. As do trabalho, também percebi agora, importam pouco.  O que é estranho, porque eles também são irmãos, amigos e filhos de alguém. Mas isso são outras conversas.
Dizem que esta fase chega a todos. Mas também dizem que passa. Fico à espera disso mesmo.

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4 Comments

  1. Lulylai |

    Entao Mufasa, que passa??
    Isso acontece com toda a gente em todas as areas... vai passar, sao fases! Prometo!
    Agora nao contes a ninguem da tua agencia ou ainda és despedida lolol ou se calhar ainda te dao um aumento por sinceridade! hehehe
    Se nao passar vem ser minha vizinha em Maida Vale, boa?
    bjs e tequilla!

     
  2. Tesha |

    "sosseguem"
    "Posso ensinar algo?"

    Todos os dias acordo demasiado cedo para isto... para ensinar aos filhos dos outros assuntos que ninguém quer saber. E tenho de chegar com o sorriso na cara para lhes mostrar que a energia cinética é um meio da massa vezes a velocidade ao quadrado. E nos 90 minutos seguintes, chegam novos clientes, com a mesmíssima vontade de aprender, e eu, qual papagaio volto a referir que a energia cinética é um meio da massa vezes a velocidade ao quadrado.
    Para agravar, a secretária de trabalho está apinhada de testes que teimam em se acumular... demasiadas asneiras que por vezes me fazem dar gargalhadas, mas que na maioria da vezes me deixam irritada por sentir que os meus clientes não me ligam nenhum.
    Só que... depois chega o momento em que uma pequena mente iluminada me diz "afinal isto faz sentido, por isso é que os carros de F1 andam tão rápido"
    E é aí que a minha alma renasce e começo a acordar com vontade de ensinar que a energia cinética é um meio da massa vezes a velocidade ao quadrado. E salto feliz pela sala de aula, dou gargalhadas, reinvento a minha forma de estar para que consiga efectivamente ensinar algo a alguém.
    Porém desta ténue linha entre o bem e o mal estar apenas resulta uma ínfima parte da minha vida.
    Porque o que realmente me define está bem para lá das paredes desta escola. Agora, incumbe-me a mim e a TI Pima, manter o equilíbrio perfeito

     
  3. Piero |

    Pois que eu partilho a opinião com a Lulylai, acho que isto é uma coisa de todas as profissões, quem sabe até da nossa vida. Toda a nossa vida é feita de fases, certo?

    Posto isto, acho que o teu lugar é claramente mais no digital do que no tradicional. É todo um mundo diferente e maravilhoso! Mas os clientes continuam iguais...

     
  4. piccola Maria |

    Está tudo de acordo, acontece a todos, sejam professores de quimica ou curadores de arte em londres. Got it :)

    bom texto T!!

    isto passa, eu sei. um ben-u-ron e amanhã tou fina! :)

     

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